Continuando com as curiosidades do processo de inventário, após falarmos do DIREITO REAL DE MORADIA, PREVIDENCIA PRIVADA, DIREITO REAL DE MORADIA, entre outros, hoje vamos falar um pouquinho sobre a questão da EQUIVALÊNCIA entre os quinhões hereditários dos bens doados em vida pelo autor da herança:
Os bens deixados pela pessoa falecida à época do processo de inventário serão partilhados entre os herdeiros necessários e parece ser uma questão matemática, cada um recebe o seu percentual.
O problema surge quando há bens doados antes do falecimento a um ou mais herdeiros em adiantamento de legítima e estes devem ser trazidos à colação, ou seja, abatidos do quinhão hereditário do herdeiro beneficiado.
A pergunta a ser respondida é, qual o valor que deve ser atribuído ao bem: aquele da época da doação ou o valor atual?
A pergunta parece simples e deve ser respondida pela norma, mas vejamos o que nos depara a letra lei para resposta.
O art. 639 do CPC é claro:
Art. 639. No prazo estabelecido no art. 627 , o herdeiro obrigado à colação conferirá por termo nos autos ou por petição à qual o termo se reportará os bens que recebeu ou, se já não os possuir, trar-lhes-á o valor.
Parágrafo único. Os bens a serem conferidos na partilha, assim como as acessões e as benfeitorias que o donatário fez, calcular-se-ão pelo valor que tiverem ao tempo da abertura da sucessão.
A resposta parece simples, o valor seria o da época da abertura da sucessão, qual seja, o do falecimento.
Verifica-se, no entanto, que há uma divergência legal, pois o Código Civil dispõe de maneira totalmente divergente:
Art. 2.004. O valor de colação dos bens doados será aquele, certo ou estimativo, que lhes atribuir o ato de liberalidade.
- 1 o Se do ato de doação não constar valor certo, nem houver estimação feita naquela época, os bens serão conferidos na partilha pelo que então se calcular valessem ao tempo da liberalidade.
- 2 o Só o valor dos bens doados entrará em colação; não assim o das benfeitorias acrescidas, as quais pertencerão ao herdeiro donatário, correndo também à conta deste os rendimentos ou lucros, assim como os danos e perdas que eles sofrerem.
O Código Civil entende que o valor seria aquele vigente ao tempo do ato da liberalidade, qual seja, aquele da época da doação.
Este critério parece não ser o mais justo, pois neste caso, se houver uma valorização desigual poderia o herdeiro beneficiado em vida ser prejudicado ou beneficiado, se levarmos em conta que o objetivo da colação é igualar os quinhões hereditários.
Em contrapartida, poderá haver uma maior dificuldade de se avaliar o bem, uma vez que o mesmo já pode ter sido alienado a terceiros, ter sofrido deterioração e ser impossível uma análise mais justa atual do benefício concedido antes do falecimento.
Estamos diante de um conflito de normas e isto se resolve fácil, qual a norma mais recente, o Código Civil vige desde 2003 e o CPC de 2015.
No entanto, há uma sobreposição do direito material (Código Civil) sobre as regras procedimentais (Código de Processo Civil) que levariam apenas ao direito material. Resposta seria, a aplicação do Direito Material.
Tal discussão se agrava a partir do momento que o juristas entendem da possibilidade de inserção de normas de direito material dentro de Leis Instrumentais.
A discussão foi levada à VIII Jornada de Direito Civil, realizada em abril de 2018 e chegaram a um consenso com a aplicação hibrida das normas:
Os arts. 2003 e 2004, do Código Civil e o art. 639, do CPC/2015 devem ser interpretados de modo a garantir igualdade das legítimas e a coerência do ordenamento. O bem doado em adiantamento de legítima será colacionado de acordo com o seu valor atual na data da abertura da sucessão se ainda integrar o patrimônio do donatário. Se o donatário não mais possuir o bem doado, este será colacionado pelo valor ao tempo de sua alienação atualizado monetariamente.
Certo é que a discussão não se esgota, mas para TEIXEIRA, Daniele Chaves, em ARQUITETURA DO PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO de 2020, 2ª Edição, Fórum, p. 61, os planejamentos sucessórios feitos anteriormente à vigência do Código Civil que levavam em conta o valor do bem à época da doação para fins de colação devem ser revistos adotando-se agora, ao falecimentos posteriores as regra da VIII Jornada de Direito Civil.
Bem doado e não vendido pelo beneficiado, deve ser reavaliado à época do falecimento.
Bem doado e vendido pelo beneficiado, deve ter seu valor corrigido monetariamente até a data do falecimento.
Nas próximas postagens, iremos abordar outros temas interessantes que poderão ser consultados com nossos advogados especialistas.
Frederico Vidotti de Rezende
OAB/PR 31.257