Continuando com as curiosidades do processo de inventário, após falarmos do DIREITO REAL DE MORADIA, PREVIDENCIA PRIVADA, DIREITO REAL DE MORADIA, COLAÇÃO DE BENS entre outros, hoje vamos versar a respeito de uma curiosidade sobre o testamento.
Inicialmente, temos que explicar que como na doação em vida, o testador pode dispor em seu testamento a um único herdeiro ou a terceiros apenas a metade de seus bens, preservando a outra metade aos herdeiros necessários, a chamada legítima.
Art. 1.789. Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança.
Poderia dispor de 100% do patrimônio, única e exclusivamente se não tivesse herdeiros necessários – descendentes, ascendentes e cônjuge (art. 1845 do Código Civil).
Mas muitas pessoas querem além de constar do testamento apenas a parte disponível, aquilo que seria destinado aos herdeiros necessários, contudo, o Código Civil teria um impedimento, ao proibir em seu art. 1.857, §1º:
Art. 1.857. Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte.
- 1 o A legítima dos herdeiros necessários não poderá ser incluída no testamento.
Numa interpretação global do Código Civil, em recente decisão, o STJ considerou válido tratar da integralidade do patrimônio, desde que a parte dos herdeiros (50%) seja respeitada.
No caso concreto, o autor da herança dividiu todo o patrimônio em Testamento entre seus filhos – herdeiros necessários – e sobrinhos – herdeiros testamentários. Na divisão, os filhos ficaram com 75% dos bens e os sobrinhos, com o percentual restante.
Duas filhas questionaram a inclusão da legítima (50%) dos herdeiros necessários na base de cálculo dessa divisão, sob a alegação de que o testamento deve compreender apenas a metade disponível do acervo patrimonial.
Pediram, assim, que o testamento fosse considerado como se só tratasse da divisão da parte disponível, excluindo-se os 50% do patrimônio que a lei reserva aos herdeiros necessários. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) acolheu o pedido.
Assim escreveu a Relatora do caso Dr. Min. Nancy Andrighi: “A legítima dos herdeiros necessários poderá ser referida no testamento, especialmente nas hipóteses em que o autor da herança pretenda, em vida e desde logo, organizar, gravar e estruturar a sucessão, mas desde que seja mencionada justamente para destinar a metade indisponível, ou mais, aos referidos herdeiros”.
Considerou válida porque “o testador se referiu, no ato de disposição, reiteradamente, à totalidade de seu patrimônio, inclusive quando promoveu a divisão dos percentuais entre os filhos, herdeiros necessários que tiveram a legítima respeitada, e os sobrinhos, herdeiros testamentários” “
O número do processo não pode ser divulgado, pois corre em segredo de justiça, mas o caso consta das notícias do STJ (Testamento pode mencionar partilha de toda a herança (stj.jus.br))
Este critério parece o mais justo, pois respeitaria a vontade do testador e não infringiria a principal norma, de garantir a legítima aos herdeiros necessários.
Frederico Vidotti de Rezende
OAB/PR 31.257