Contrato de Aprendizagem e as novidades da Portaria nº 3544/2023 do MTE

Em 19 de outubro de 2023, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) publicou a Portaria nº 3.544, que compilou normas existentes e trouxe algumas novidades ao regulamentar diretrizes específicas sobre a aprendizagem profissional. Nesse informativo, destacamos alguns dos seus principais aspectos:

 Empregado Monitor

A empresa deverá designar formalmente um monitor para coordenar e supervisionar o aprendiz, que manterá contato permanente com a entidade formadora, a quem recorrerá antes da tomada de qualquer decisão ou providência.

Centralização da Aprendizagem

Os empregadores que possuem vários estabelecimentos em um mesmo município estão autorizados a centralizar as atividades práticas dos aprendizes em um ou mais desses estabelecimentos, ao invés de dispersá-las entre todos os CNPJs. Essa centralização pode ocorrer dentro do mesmo município ou em municípios adjacentes, e deve observar determinadas condições e procedimentos.

Mesmo que as atividades práticas de um aprendiz sejam centralizadas em um determinado estabelecimento, isso não altera o vínculo empregatício do aprendiz com o estabelecimento original. Em outras palavras, o aprendiz permanece formalmente ligado ao estabelecimento que o contratou, independentemente de onde ele realiza suas atividades práticas.

Da mesma forma, a centralização não afeta a contagem de aprendizes para fins de cotas nos estabelecimentos. O aprendiz não é contabilizado na cota do estabelecimento onde realiza suas atividades práticas, mas sim no estabelecimento que o contratou.

Modalidade Alternativa de Cumprimento de Cota

A Portaria regulamentou o art. 66 do Decreto nº 9.579, de 2018, que cria alternativas para o cumprimento da cota, em estabelecimentos que possuam impedimentos práticos em suas operações, listando no seu art. 54, as atividades que podem ser cumpridas em uma entidade externa que proporciona a experiência prática para o aprendiz. A seguir, o rol dos setores econômicos especificamente contemplados na Portaria:

  • asseio e conservação;
  • segurança privada;
  • transporte de carga;
  • transporte de valores;
  • transporte coletivo, urbano, intermunicipal, interestadual;
  • construção pesada;
  • limpeza urbana;
  • transporte aquaviário e marítimo;
  • atividades agropecuárias;
  • empresas de terceirização de serviços;
  • atividades de telemarketing;
  • comercialização de combustíveis; e
  • empresas cujas atividades desenvolvidas preponderantemente estejam previstas na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil – Lista TIP, aprovada pelo Decreto nº 6.481, de 12 de junho de 2008.

O Ministério do Trabalho e Emprego poderá acatar, mediante requerimento, a solicitação de outros setores que venham apresentando desafios na integração de aprendizes devido à natureza de seu trabalho ou local de operação.

A empresa interessada que se enquadre no cenário acima deverá solicitar ao Ministério do Trabalho e Emprego a assinatura de um Termo de Compromisso, cujas cláusulas irão prever a modalidade de cumprimento da aprendizagem alternativa.

O termo deve incluir uma obrigação de contratar jovens e adolescentes em situação de vulnerabilidade ou risco social, dentre os quais: a) adolescentes egressos do sistema socioeducativo ou em cumprimento de medidas socioeducativas; b) jovens em cumprimento de pena no sistema prisional; c) jovens e adolescentes cujas famílias sejam beneficiárias de programas de transferência de renda; d) jovens e adolescentes em situação de acolhimento institucional; e) jovens e adolescentes egressos do trabalho infantil; f) jovens e adolescentes com deficiência; g) jovens e adolescentes matriculados na rede pública de ensino, em nível fundamental, médio regular ou médio técnico, inclusive na modalidade de Educação de Jovens e Adultos – EJA; e h) jovens desempregados e com ensino fundamental ou médio concluído na rede pública.

Uma vez firmado o termo, o estabelecimento e a entidade formadora formarão parceria com uma entidade concedente para atividades práticas, que serão desenvolvidas não na empresa e sim na entidade formadora.

Transferência do Aprendiz

A transferência de um aprendiz é permitida entre a matriz e suas filiais, entre diferentes filiais da mesma empresa ou entre estabelecimentos de um mesmo grupo econômico. No entanto, é imperativo que essa mudança não seja prejudicial ao aprendiz, especialmente em relação ao seu processo educativo e ao horário da escola regular.

Com a transferência, o aprendiz deixa de ser contabilizado na cota do estabelecimento original e passa a ser incluído na cota do novo estabelecimento. Esse ajuste é fundamental para que ambos os estabelecimentos estejam em conformidade com as obrigações legais relacionadas à contratação de aprendizes.

Direitos do Aprendiz

A Portaria regulamentou algumas lacunas em relação aos direitos dos aprendizes, bem como trouxe algumas novidades que merecem destaque:

Férias:

O período de férias do aprendiz deve ser estipulado com base no calendário de atividades teóricas e práticas.

O § 1º do Art. 63 traz uma novidade significativa, permitindo o parcelamento das férias do aprendiz, seguindo o que está estipulado no art. 134 da CLT. Isso oferece uma flexibilidade maior tanto para o empregador quanto para o aprendiz, podendo adaptar o período de descanso às necessidades e particularidades de cada situação.

Outra novidade, em relação aos contratos com duração de dois anos, há obrigatoriedade do gozo das férias adquiridas no primeiro período, garantindo que o aprendiz tenha seu descanso assegurado ao longo do contrato.

Acerca das férias coletivas do estabelecimento, para o aprendiz, caso estas não coincidam com o seu período previamente definido ou com o período de férias escolares (para os menores de 18 anos), elas serão consideradas licença remunerada. Além disso, se houver atividades teóricas sendo ministradas durante esse período, o aprendiz deverá continuar frequentando-as.

Remuneração:

A remuneração do aprendiz deve ser calculada com base na hora trabalhada. Considerando que normalmente a jornada do aprendiz é reduzida, a remuneração deve ser proporcional ao número de horas trabalhadas. Mesmo que o aprendiz tenha uma jornada de trabalho equivalente a um empregado regular (no caso de aprendizes acima de 18 anos que já concluíram o ensino fundamental), ainda assim, seu salário deve refletir a natureza formativa e educacional de seu contrato.

O valor da hora trabalhada deve observar, saldo condição mais benéfica: o valor do salário-mínimo nacional; o salário-mínimo regional fixado em lei, para os Estados que adotam o piso regional; ou o piso da categoria previsto em instrumento normativo, quando houver previsão expressa de aplicabilidade ao aprendiz.

Jornada de Trabalho:

O teletrabalho, ou trabalho remoto, quando adotado nos contratos de aprendizagem, deverá, ser  inteiramente gratuita, compatível com as atividades práticas do contrato de aprendizagem; e ser adotado aos empregados do setor no qual o aprendiz estiver alocado, vedada a adoção dessa modalidade de trabalho exclusivamente aos aprendizes.

O aprendiz que trabalhar em serviços permanentes de mecanografia (datilografia, escrituração ou cálculo), a cada período de 90 (noventa) minutos de trabalho consecutivo deverá ter um repouso de 10 (dez) minutos não deduzidos da duração normal de trabalho.

Licenças e Afastamentos:

A garantia da estabilidade provisória à aprendiz gestante reafirma a importância de proteger os direitos das mulheres no ambiente de trabalho, mesmo quando em posição de aprendizado. As regras estabelecidas asseguram que a aprendiz gestante não seja prejudicada em seu processo de aprendizagem devido à maternidade.

A extensão dessas garantias para os casos de garantia provisória de emprego acidentária também protege o aprendiz em situações de acidentes de trabalho, determinando-se a observância do disposto no Art. 118 da Lei nº 8.213/1991.

Por fim, as diretrizes sobre afastamentos em razão de serviço militar ou outros encargos públicos garantem que o aprendiz possa cumprir seus deveres civis sem prejudicar seu contrato de aprendizagem.

Conclusão

Em suma, a Portaria vem a compilar legislação esparsa e a regulamentar alguns pontos lacunosos.

texto por Dr. Rafael Kenji Freiberger Nagashima, OAB/PR 51.180